Deveria ser a fumaça inexistente mas por diversos motivos não se enxergava. As paredes eram pretas, algumas com espelhos mal cuidados colados, onde ela sempre parava para um check up. A única explicação racional era de que a fumaça vinha da respiração das pessoas. No calor de um espaço fechado subterrâneo, pessoas trombavam umas contra as outras na competição pela preservação da espécie: as mulheres, com os joelhos levemente inclinados fazendo com que sua bunda ficasse um pouco mais para cima do que eventualmente já estaria dentro das justas calças jeans e saias e sempre um homem por trás, com a mão na cintura delas, segurando com força para que pudesse controlar por ali. Segurando -as pelo meio do corpo, as tinha inteiras deles. As vezes, um homem na frente também se escorando em alguma parte do corpo mais acima.
As pessoas precisam se segurar. A falta do que fazer com a vida, a insatisfação no trabalho, no relacionamento, a alienação eletrônica, tudo isso faz com que, cada vez que se vejam em ambientes confinados, tateiem como cegos os corpos alheios por um reconhecimento que os legitime de alguma maneira, seja por sentimentos ou sensações, coisas que não se separam mais: amor é desejo, desejo pede satisfação e satisfação vem.
E movimentam-se.
No dia seguinte, tudo nela doía. Pernas e barrigas e mais anseio pelo toque, dessa vez, delicado e sutil.
Sentou e escreveu no diário: Por favor, coloque suas mãos em mim.Eu não vou sair daqui.
- Alice! Alice!!! Acorda! O que houve, está com sono? Tá fazendo o que sentada aí? Não está ouvindo? Está tocando " Gimme more", vamos dançar?
- Vamos.
Um comentário:
Muito bom, esse clima de "imaginação deliberada". Essa fumaça no início j´deixa quem lê mergulhado na atmosfera pouco nítida, me remete a sonho mesmo.
Deixa eu dizer: adorei essa parte:
"As pessoas precisam se segurar. A falta do que fazer com a vida, a insatisfação no trabalho, no relacionamento, a alienação eletrônica, tudo isso faz com que, cada vez que se vejam em ambientes confinados, tateiem como cegos os corpos alheios por um reconhecimento que os legitime de alguma maneira, seja por sentimentos ou sensações, coisas que não se separam mais: amor é desejo, desejo pede satisfação e satisfação vem."
Estamos todos precisando mesmo de nos reconhecer. Essa imagem de tatear é maravilhosa. Pelo tato a gente reconhece formas; mas também pelo tato sentimos infinitamente.
Achei esse trecho muito, muito bom!
Beijos!
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