
Uma vez, eu fiquei muito chocada porque um homem que eu tinha conhecido apenas há alguns dias me disse que eu era muito melancólica, que eu parecia estar sempre triste.
Me chocou não por eu não concordar com ele, no fundo, era verdade, ele era apenas um bom observador, que nas três vezes em que me viu, antes de me dizer isso, prestou atenção que mesmo num ambiente como o de uma boate, eu conseguia, em meio à toda aquela euforia etílica dos demais, me sentar sozinha e triste. E também, porque ele já havia me visto chorar algumas vezes.
O que mais me incomodava, foi a mudança da imagem que as pessoas tem. Lembro claramente quando um amigo meu uma vez quis me escrever, e disse que a minha alegria era capaz de iluminar qualquer lugar. Eu costumava ser alegre, muito, por sinal. Serelepe, até. Sair disso pra melancólica e triste, mesmo que seja bom nalgum momento, como pra escrever, por exemplo, é perturbador. Mais perturbador, é eu não discordar do rótulo. Aceitá-lo queimando, goela abaixo, porque é exatamente isso.
Tem muitas imagens que eu tenho que aceitar, ainda que não concorde com elas. Como a da bonequinha de porcelana. Pele branca, rosto frequentemente vermelho pela vergonha, cabelo preto e cacheado forma o que? Uma boneca de porcelana. Que aparentemente é frágil também e dá medo das pessoas quebrarem.
Good news: eu não quebro não! Pode jogar no chão que eu continuo inteira. Não que seja ruim ser uma boneca de porcelana, mas me dá raiva que me tratem diferente, que me peguem diferente, que façam tudo comigo de outra forma por acharem que eu "não vou aguentar". E na hora de fazer merda? Será que alguém pensa na minha suposta fragilidade? Acho que não!
E não é só isso, ser uma boneca implica em ser uma menina exemplar, 24 horas por dia. Ser aparentemente frágil, estar bonitinha, bem penteada, bem vestida, com as unhas feitas, ser delicada, bem educada, não falar palavrão, sentar que nem mocinha, ser submissa. Tem vezes que eu não quero.
Alias, será que já passou pela cabeça de alguém que uma mulher (mulher?) de 20 anos não quer ser vista como uma bonequinha, mas como outra coisa? Eu acho meio doentio, uma pessoa, adulta se apaixonar e ter tesão numa boneca de porcelana. Ainda que essa porcelana ande, fale, pense e seja de carne e osso.
Será que se eu quebrasse, melhoraria?
. Mayra, a bonequinha de porcelana que está crescendo, ficando cada dia mais melancólica, esquecida, que quer tentar perder um pouco a fragilidade, quer escrever também sobre sexo, drogas e violências .
A imagem real ainda está em construção, e vocês só vêem a virtual.
Um comentário:
esta é a vantagem da escrita, vc pode ser outra pessoa para escrever. eu, por exemplo, nunca escrevo na versão de mim que eu mostro aos outros. tenho na escrita a minha liberdade da prisão de valores e moarais que eu aprendi a ter.
lembre-se que os grandes autores góticos brasileiros nunca se feriram como diziam em seus textos, apenas o faziam no plano da escrita, para liberar a tensão que sentiam.
eu vejo o meu irmão jogando videogame e penso que a minha escrita nada mais é que a minha realidade virtual, só que não permite que os outros a vejam em 3D, com artifícios e efeitos colaterais. eu morro num texto e continuo viva, eu sangro e sofro na escrita para manter o difícil sorriso que insisto em carregar.
vc sempre poderá ser quem vc quiser ser, não é só porque não brincamos mais de boneca que esta versão ficou limitada. que então se vista de forte e seja forte, ainda que seja na escrita. que use luxo e penas e se faça mais sensual e sexual do que qualquer menina do mulin rouge. liberte-se mayra!
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